21 de março
Logo que o desenvolvimento espiritual do menino o permitiu, levaram-no os pais a Roma, com o fim de encetar os estudos numa escola pública. O meio em que as circunstâncias o obrigaram a viver, não lhe agradou e receando o naufrágio de sua inocência, em companhia de tantos moços, que levavam vida repreensibilíssima, resolveu cortar todas as relações com o mundo. Para pôr em seguro a salvação, abandonou Roma e retirou-se para um lugar ermo.
A aia, que lhe era muito dedicada, acompanhou-o trinta milhas, até uma aldeia de nome Afila. S. Bento, subtraindo-se à vigilância da boa mulher, escondeu-se no ermo de Subiaco. Jovem de 15 anos apenas, encontrou-se São Bento com o eremita Romano, que lhe deu o hábito de monge, instruindo-o sobre a vida regular e os respectivos deveres. Em seguida levou-o a uma gruta, bem retirada, na serra, desconhecida e de difícil acesso.
Foi esta gruta, chamada gruta santa, que S. Bento escolheu para morada. Romano prometeu-lhe a mais estrita reserva sobre o esconderijo e também trazer-lhe a provisão necessária de mantimentos. Três anos passou São Bento naquela gruta, sem receber visita, a não ser de Romano. Deus, porém, querendo fazer brilhar a luz da santidade de seu servo, pôs a descoberta a existência do jovem eremita. Um sacerdote daquela região, estando a preparar a refeição, ouviu uma voz dizendo: “Estás preparando teu jantar, quando meu servo Bento morre de fome no deserto”. O servo de Deus pôs-se a caminho, em procura do Santo e só superando inúmeras dificuldades o encontrou. Bento, admiradíssimo de receber visita, não quis conversar com o desconhecido, senão depois de ter passado algum tempo com ele em oração. O sacerdote ofereceu-lhe em seguida comida e insistiu para que se alimentasse, pois não achava conveniente o jejum em dia da Páscoa. S. Bento ignorava esta circunstância. Terminada a refeição, o sacerdote retirou- se. Tempos depois o paradeiro de S. Bento foi descoberto por pastores. Estes, vendo-o, julgaram estar diante de um animal feroz, engano causado pelas peles de animais, com que São Bento se cobria, e pelo fato inesperado de encontrar-se um ente humano nos rochedos de Subiaco, por todos classificados de inabitáveis.
Assim foi aos poucos conhecida a morada do Santo nos rochedos de Subiaco, em particular a gruta, que se tornou alvo da visita de muita gente, que lá ia para receber conselho e conforto do santo eremita.
Quem julga ser o ermo lugar inacessível a tentações, engana-se. A gruta de Subiaco, tão afastada do bulício do mundo, foi teatro de lutas horríveis. O demônio, que perseguiu o Divino Mestre até o deserto, descobriu também o esconderijo de S. Bento, e tudo fez para demover o Santo do caminho de Deus. Ora importunava-o com a aparição em forma de um pássaro preto; ora eram os jogos de fantasia, com que projetava diante da alma do jovem as imagens mais sedutoras da vida de Roma. A tentação era tão forte, que foi preciso Bento lutar com a máxima energia, para não deixar o ermo e voltar ao mundo. Para extinguir o fogo da paixão e quebrar o aguilhão da tentação, São Bento revolvia-se em espinhos, conseguindo por estes meios extraordinários a vitória do espírito sobre a carne.
Devido à fama de santidade, foi enorme o número de pedidos dos que desejavam viver sob a direção do santo eremita. Após muitos rogos insistentes, aceitou a dignidade de Abade do Convento de Vivovaro. A disciplina daquele Convento, porém, estava tão corrompida, que São Bento se viu obrigado a proceder com bastante rigor, no intuito de reconduzir os monges relaxados à observância fiel da regra. Formou-se entre os religiosos tão entranhada antipatia contra o santo superior, que terminou por degenerar em ódio. Para livrar-se-lhe da vigilância, conceberam o plano sinistro de matá-lo. Adicionaram forte dose de veneno ao vinho, que ia ser apresentado a São Bento.
Quando este, porém, conforme o seu costume de benzer o alimento antes de o tomar, fez o sinal da cruz sobre a bebida, o copo partiu-se. Longe de se irritar com este fato, disse aos irmãos: “Deus vô-lo perdoe, meus irmãos. Tendes agora a prova de que tive razão, quando, logo no princípio, vos disse que os meus costumes não combinavam com os vossos”.
São Bento abandonou o convento dos monges rebeldes e voltou para Subiaco. Lá o número dos discípulos crescia-lhe de dia para dia, de modo que, em poucos anos foi preciso fundar doze conventos. São Gregório fala de muitos milagres, que S. Bento fez na época da fundação dos mosteiros. As famílias mais nobres de Roma, confiavam os filhos à direção do santo homem. Os Santos Plácido e Mauro, ambos filhos de senadores de Roma, figuraram entre os primeiros educandos de S. Bento.
O inimigo de Cristo via com grande desgosto os progressos da nova Ordem, e não se descuidou de armar-lhe o laço. O instrumento de que se serviu, foi um mau sacerdote, vizinho de Subiaco. Florêncio, assim se chamava a infeliz criatura, espalhou horríveis calúnias contra o Santo. S. Bento não teve outra resposta, senão o silêncio. Receando que sua presença pudesse irritar ainda mais o mau gênio de Florêncio, saiu de Subiaco e fixou residência em Monte Cassino. Mal tinha saído de Subiaco, quando teve notícia da morte repentina do caluniador, soterrado nos escombros de uma casa.
No cume do Monte Cassino existia um templo do deus Apolo e perto do templo havia um bosque, consagrado à mesma divindade. Templo e bosque gozavam ainda de grande veneração. Vexado com este resto de paganismo, S. Bento começou a pregar o santo Evangelho. A pregação e os numerosos milagres que fazia, converteram muitas pessoas. O templo foi derrubado e nas ruínas se ergueram dois conventos, sob a invocação de S. João Batista e S. Martinho. Tal é a origem do célebre mosteiro de Monte Cassino, fundado no ano de 529, quando S. Bento contava 49 anos de idade, sendo Justiniano imperador, Papa Felix IV, e rei da Itália Atalárico, chefe dos Godos.
S. Bento não possuía a ciência das coisas profanas; tanto mais versado era na ciência de Deus e da salvação. Em Monte Cassino escreveu a admirável regra para a vida monástica. Nesta obra monumental S. Bento revela um profundo conhecimento da alma humana e da ciência que a conduz ao ápice da perfeição. S. Gregório encantava-se com o espírito de sabedoria e modéstia desta regra e não hesitava em preconizá-la entre todas a primeira. A regra de São Bento foi adaptada por todos os monges do Ocidente e conservou-se por muito tempo como base da vida monástica. Eis o que prescreve a dita regra: o silêncio, a oração, o trabalho, o recolhimento, a caridade fraterna e a obediência. São Bento chama sua Ordem escola para aprender servir a Deus. Ele mesmo mostrou pelo exemplo a excelência da obra. Sendo superior da Ordem, era para todos os filhos o modelo de monge exemplar. Como outro Moisés, escolhido por Deus para conduzir o povo eleito, de Deus recebeu o dom dos milagres e da profecia, para autenticar-lhe a alta missão. A natureza era-lhe sujeita e o segredo das coisas futuras desvendava-se-lhe ante os olhos. Na presença de muito povo chamou a vida um noviço, cujo cadáver foi tirado dos escombros de um muro desmoronado. Predisse que o mosteiro Monte Cassino seria profanado e destruído, o que aconteceu no ano de 850, por ocasião da invasão dos Lombardos e na grande guerra mundial, em 1944.
Totila, rei dos Godos, quis provar o espírito profético do Santo, e ordenou a um dos oficiais, chamado Rigo, que se apresentasse a S. Bento em traje real e com a comitiva da corte. Rigo compareceu na presença de S. Bento, o qual, vendo-o sem se levantar da cadeira, lhe disse: “Meu filho, tira a vestimenta que usas, porque não é tua”.
Totila, sabendo deste fato, foi ver o abade de Monte Cassino e admirou-se grandemente, vendo-se recebido pelo Santo com estas palavras: “Já praticaste muitos males e como vejo, maiores ainda praticarás. Hás de tomar Roma, transpor o mar e reinar por espaço de nove anos. No décimo ano morrerás e comparecerás perante o tribunal de Deus, onde darás conta de tudo o que fizeste”. Esta profecia cumpriu-se em todos os detalhes. Totila assustou-se bastante com as palavras do santo Patriarca, a cujas orações se recomendou. Tendo tomado mais tarde Nápoles, tratou os prisioneiros com uma caridade tal, que não se poderia esperar de um rei bárbaro.
É provável que S. Bento tenha morrido pouco depois de sua santa irmã Escolástica, e um ano depois da visita do rei Totila. Predisse a sua morte e seis dias antes mandou abrir a sepultura. No sexto dia da doença foi levado à Igreja, para receber os últimos sacramentos. Depois de ter feito umas exortações aos religiosos, de pé, e as mãos elevadas ao céu, exalou o espírito, em 21 de março de 543, tendo a idade de 63 anos. Grande parte das relíquias descansam no mosteiro de Monte Cassino hoje completamente restaurado. As outras foram transportadas para a abadia de Fleury, na França.
1. Em muitas coisas podes imitar o santo exemplo do grande Patriarca. Se não te é dado viver, como ele, afastado do mundo, servindo a Deus na solidão, não te será difícil fazer do domingo um dia de recolhimento espiritual, dedicando-te mais do que nos outros dias a práticas de piedade e caridade. Além de assistir à santa Missa, poderias fazer uma leitura espiritual, visitar um doente, fazer uma visita ao SS. Sacramento e examinar mais detidamente o estado de tua alma.
2. A vida de S. Bento foi de penitência rigorosa. Motivos deves ter para penitenciar-te também por teus pecados e firmar-te no propósito de abandonar a senda do pecado. A melhor penitência é o fiel cumprimento dos deveres do estado, é aceitar e suportar com paciência a cruz, que se apresenta em forma de contrariedades; é fazer oração, jejuar e dar esmolas aos necessitados.
3. O zelo de S. Bento pelas almas poderás imitar pelo bom exemplo, que deves dar a teu próximo, principalmente às pessoas de tua família. Diz S. Paulo, que aquele que não se interessa pelo bem-estar das pessoas de sua convivência íntima, é pior que pagão.
4. Um olhar precipitado e imprudente que S. Bento, moço ainda e quando no mundo lançou sobre uma pessoa do outro sexo, causou-lhe grandes tentações; para debelá-las foi preciso castigar severamente o corpo e fazer dura penitência. Engana-se e está no caminho para o pecado, quem supõe poder dar toda a liberdade aos olhos. Job dizia: “Eu fiz um pacto com os meus olhos, para que não fixassem culposamente sobre uma donzela”. Quem não põe um freio aos olhos, mais cedo ou mais tarde verá o inimigo, (a fera de que fala S. Pedro) em sua casa. Nesta matéria todo o cuidado é pouco. A concupiscência, a inclinação má da nossa natureza aos pecados carnais, é a inimiga mais terrível que temos. Quem se meter a brincar com ela, tornar-se-á seu escravo; a queda será certa, certíssima.
Santos, cuja memória é celebrada hoje
Em Alexandria a memória de alguns mártires. Reunidos nas suas igrejas na Sexta-Feira Santa, foram agredidos e mortos por arianos e pagãos; era imperador Constâncio e governador Filagoio.
Em Catânia, na Sicilia. S. Berilo, discípulo de S. Pedro, que o sagrou. Tendo convertido muitos pagãos, morreu em idade avançada.
Em Alexandria, S. Serapião, antes eremita e depois Bispo de Tunis. Perseguido pelos arianos, morreu no exilio.
Em Lion, o abade S. Lupizino.
Extraído do Livro Na Luz Perpétua — Pe. João Batista Lehmann
I. Volume – V Edição - 1959.
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